Era fim de tarde quando resolvi me juntar em pedaços e ir até o lugar mais alto da cidade. De lá se via o pôr-do-sol como se ele estivesse brotando pelos olhos. Olhava para os lados assustado. Afinal, só se via dali um unico sinal de vida humana: um pequeno chalé. Fui me aproximando enquanto o sol me refletia alaranjado e, com o medo nas mãos, bati na porta. Havia um recado pendurado no portão, que dizia: "Ser é ousar ser". Eu tive certeza de que aquele recado era para mim, e para todos os outros seres desse planeta, é claro. Um velho senhor abriu a porta.
- Você é? - Disse ele.
- Sim, eu sou.
- Existir é fácil, meu jovem, existir é fácil! - Me disse o velho, abrindo caminho para a sua casa.
Naquele momento eu não tive certeza se eu realmente vivia, ao contrário da maioria dos habitantes desse mistério suspenso ao ar, que apenas existem. Andei como se o chão estivesse flutuando sob meus pés. Ele puxou uma cadeira e disse para eu me acomodar. Sentei e ele disse.
- Eu tinha certeza de que eu não era o unico poeta dessa região.
- O que o senhor quer dizer com isso?
- Quero dizer o simples meu caro, ninguém mais além de um poeta se importaria tanto em ver um pôr-do-sol à ponto de subir ao lugar mais alto e isolado da cidade só para vê-lo.
Me afundei em pensamentos naquele exato momento e pude realmente concordar com o tal senhor de barbas brancas. De todos os humanos que eu tinha contato, nenhum deles olhava para o céu, nem mesmo quando o sol estava se deitando sobre o nosso gigante mapa-mundi.
- Por acaso o senhor é poeta? - Perguntei intrigado.
- Sim, eu já lhe disse. - Respondeu ele.
- O que faz de uma pessoa um poeta?
- Escrever e observar coisas que ninguém mais observa.
- O quê, por exemplo?
- Quando um menino abraça sua grande amiga ou quando eles se deitam na grama e ficam olhando para o céu em silêncio por horas e horas.
- Obrigado! - Disse eu, apressado.
- Não tem de quê, meu jovem. - Respondeu o velho poeta.
Dei adeus à ele com toda a pressa do mundo e saí correndo para casa. Abri a porta do meu quarto com tanta vontade que fiz um barulho ensurdecedor. Comecei então à arrancar de mim palavras. Aos poucos fui escrevendo-as nas paredes. Me fiz poeta e poesia para o mundo, tudo ao mesmo tempo. Quando percebi eu já estava navegando em meu proprio choro. Estava chovendo cores e chorando palavras, enquanto o mundo girava no meu olhar.
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